domingo, 19 de dezembro de 2010

CAPOEIRA DA VIDA

Aquela época eu havia terminado a faculdade de Administração com todas aquelas “lindas teorias” prontas para por em prática na próxima empresa que eu fosse trabalhar.
A minha primeira entrevista depois de formado foi em uma construtora, meu atual emprego de onde a cada dia aprendo mais, são algumas dessas “lições” ou “experiências de vida” que eu quero compartilhar no blog.
O que a faculdade não me ensinou é que havia um mundo muito, mas muitooo diferente daquelas “lindas teorias”, que para executar meu trabalho, eu iria ter que entender tudo aquilo que estava em minha volta, aprender a jogar e entender o que se está jogando, a ter que dançar conforme a música, se preciso gingar, esquivar, ter equilíbrio – “jogar capoeira” analisando o adversário, e entrar na roda com toda malícia – trabalhando com o corpo, espírito e alma.

Um dos primeiros dias que eu levei “um tapa na cara” da vida para abrir os olhos de como deveria encarar o ritmo, foi com um negro chamado Jorge - o Mestre Carvoeiro, um negro mestre de capoeira angola que trabalhava na empresa.
O Mestre Carvoeiro tinha uma malícia em seu jeito de andar, de falar arrastado, com uma educação digno de um mestre – Jorge tinha um jeito de dar bom dia com um sorriso de mostrar os dentes que encantava a todos aqueles que conseguia ter a percepção e entender o valor de um verdadeiro sorriso, aquele bom dia que dá prazer em começar o dia. Seu serviço era fazer sondagem a trado em solo (abrir buraco). No fim do dia aquele negro sujo de terra ia para vestiário e era o último a deixar a empresa, pois se limpava e colocava a sua tradicional calça branca, cinto preto, camisa por dentro da calça e seu chapéu estilo boina da cor branca e seu sapato bege.
A vida ensina que por mais simples que a pessoa seja ela pode ser educada, e fazer todo serviço com dignidade e com cabeça erguida. Eu havia acabado de receber aquele suado dinheiro no começo do mês, como de costume peguei duas lotação LOTADA e fui para casa. Era perto das 19 horas em uma sexta-feira quando eu desci para ir no banco dois pontos antes do normal para sacar meu dinheiro. Assim que desci do ônibus vi aquele negão com um sorriso daqueles, que denunciava que estava aprontando alguma.
Perguntei se ele morava por ali e o que estava fazendo por aquela região? Ele estava no Ponto de Encontro um barzinho perto de casa com sua esposa, a ruiva professora de capoeira Pipoca catando no karaokê, dançando pagode e estava indo ao supermercado. Eu perguntei; - Mas Jorge o que você vai comprar no mercado?
Ele logo contou seu plano, dar verdadeiro valor aquelas pessoas que amamos que estão ao nosso lado em todos os momentos: - Foi aniversário da minha esposa na quarta-feira e como eu não tinha dinheiro não deu pra fazer nada. Hoje que recebi trouxe ela pra dançar e deixei ela ali no Ponto de Encontro com alguns amigos, porque vou no mercado comprar um bolo pois eu não pude dar no dia.
O reconhecimento e a lembrança deve ter sido o maior presente que a professora pipoca deve ter ganho, não importa a data para mostrar o tão importante ela é na vida dele.  Os momentos podem ser recuperados quando feitos de coração.

            A vida joga com nós a todos os momentos, só aqueles que tem a percepção de reconhecer um verdadeiro sorriso vão saber entrar na roda e jogar com a vida. Pode ser que ela em alguns momentos pareça te dar uma rasteira ou um tapa – mas alguns momentos mais tarde ao superar você vai saber que a vida não é marcada pelas rasteira e sim pelos aprendizados dos tapas que fizeram abrir os olhos e fazer suas escolhas.       Hoje o Mestre Carvoeiro anda gingando em outras rodas mas suas ações O BOM DIA, BOLO, MALÍCIA, DEDICAÇÃO NAQUILO QUE FAZIA ficaram marcadas nas vidas das pessoas que passou (Digno de um Mestre). Seja um mestre naquilo que faz.

domingo, 12 de dezembro de 2010

BIOGRAFIA DE CARLINHOS – O ALAGOANO


Carlos Henrique da SILVA, o Alagoano tem nome de nordestino, nome de brasileiro, nascido dia dezenove de abril de um mil novecentos e setenta e nove em São José da Laje – Alagoas. Filho de uma batalhadora analfabeta, passou por algumas dificuldades (inclusive a fome, desnutrição), mas com toda sua história de vida não perde o sorriso no rosto.
            O Alagoano com 31 anos parece ter passado por tantas situações em sua vida, que a cada ano que diz ter vivido corresponde a uns 10 anos a mais que a vida de uma pessoa normal (a rotina em nosso cotidiano nos prende, e não paramos para pensar que a vida passa, o tempo é curto, as situações não voltam), são experiências que seriam tristes se não fosse cômico ou vice e versa.
            Essa é uma história para aprendemos a dar valor, crescer, sabermos a viver mesmo de maneira simples, intensamente.

DE ONDE VEIO

Como falar de Carlos Henrique da Silva se antes não falar do nordeste, aquela terra de famílias grandes (grandes em quantidade de filhos, grandes na luta pela sobrevivência, grandes a forma em encarar a vida, mesmo com dificuldades sempre com o sorriso no rosto, com uma piada na ponta da língua em qualquer situação).
Mas quais a diferenças e as semelhanças entre alagoanos, baianos, cearenses, maranhenses, paraibanos, pernambucanos, piauienses, rio norte grossense, sergipanos? As diferenças eu não sei dizer, agora aquela cabecinha chata se reconhece de longe.... É “sabido” que aquela cabecinha chata é de carregar galões imensos com água nas cabeças.
Há nordeste local de belezas naturais sem igual, povo hospitaleiro, batalhadores, com um estado de humor que apenas (Chico Anysio, Tom Cavalcante, Tiririca, Falcão, DIDI MOCÓ e não tão famoso assim – mas tão humorado quanto Carlinhos Alagoano) sabem como ninguém a arte de fazer sorrir, pois só aquele sotaque é engraçadíssimo por si só. Que por outro lado o agreste e o sertão, devassa aqueles rosto com rugas ou marcas da vida registradas em seu corpo. Nordestino que labuta naquela terra castigada pela seca, que a sua aparência cansada e doente, pele fosca, cabelos claros (por causa da desnutrição), fala confusa, não os impedem de sorrir.
Carlos Henrique (Carlinhos) veio de lá, um típico nordestino, cabeça chata, alagoano, um metro e meio de altura, valente como um cão, cabra macho, porreta da porra, arretado, que tem um sorriso e um jeito de levar a vida que só um nordestino tem.
Se entrássemos dentro do coração do Alagoano íamos ver que em seu peito bate um poema do grande poeta Gonçalves Dias:

“Minha terra tem palmeiras,
onde canta o sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
não gorjeiam como lá”.

Que falta faz a Alagoas, terra de onde brotou Carlinhos. Se aquela terra tivesse a metade das oportunidades que o Paraná tem, se o canto do sabiá de lá fosse iguais os daqui, talvez aquele alagoano tivesse ainda mais motivo para sorrir e nos divertir. Carlinhos tem um sonho em seu coração, mesmo daquele grande poeta Gonçalves Dias:

“Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu`inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá”.


            PAI

            Carlinhos chama de pai o padrasto, que foi a figura de homem em que pode se espelhar, o padrasto foi parceiro e muito mais que um pai, lhe mostrou de certa forma algo sobre o mecanismo da vida.
            Já o pai real separou-se muito cedo de sua mãe, certa vez “sequestrou” Carlinhos com 3 para 4 anos. Dizia que iria o criar o levando dos braços da mãe. O Alagoano devia ser a “peste” como o “cão”, desde essa época. São os primeiros registro que aquele garoto tem das grandes história que passou. Uma semana, esse foi o tempo para que seu pai o devolvesse para a mãe, dizendo que nunca mais queria o ver na vida.
            Reza a história que pai é aquele quem cria, é aquele que orienta, que está ao lado nas dificuldades, que tem amor incondicional, que respeita. O Alagoano foi conhecer seu verdadeiro pai com 25 anos, mas nunca tiveram uma relação. Da mesma forma Carlinhos é pai de um menino de 11 anos, chamado Paulo Henrique fruto de um relacionamento anterior e não tem muito contato, pois o menino mora em Alagoas com a mãe e a avó materna. O “Bunequinho” (Paulo Henrique) é lembrado com carinho, mesmo não tendo a presença física com seu filho é em suas orações recorda e no sonho de um dia poder recuperar o tempo perdido.

            IRMÃOS

            Dá para acreditar em 25 irmãos, o alagoano tem 3 irmãos do mesmo pai e mãe e o restante da prole espalhados pelo nordeste.
            Carlinhos teve um irmão com deficiência, ele conta que a criança não tinha a estrutura do pescoço (típico caso de paralisia infantil). Este irmão faleceu ainda quando Carlos era criança, hoje um mora em Alagoas com a mãe e ele e mais um irmão moram em Sarandi.

            MÃE

            Filho de mãe analfabeta, Carlos faz dos ensinamentos da mãe grandes lições de vida. Isso também o faz buscar aprendizado, pois conhece de perto a situação de uma pessoa sem estudo.
            Sua mãe apesar de não conhecer as letras, Carlos diz que não existe no mundo pessoa com maior educação e disposta a ajudar outros (uma educadora pelas experiências da vida).
            É a mãe que todos os finais de semana fala com o filho pela internet, preocupada como estão as coisas. Carlos lembra que os seus primeiros namoros era sua mãe que “ajeitava” as amigas para ficar com o menino.

            SEXO

            Iniciou sua vida sexual muito cedo, com muitos casos. Diz já ter passado de 100 casos amorosos (isso porque é um menino muito bonito). Foi com 13 anos que seu padrasto lhe deu 5 Cruzeiros para perder a virgindade com uma meretriz.
            Tudo combinado com a moça foram para um canavial e começaram a fazer sexo, Carlinhos era acostumado a assistir filmes pornográficos ficava gemendo como nos filmes e a moça pensando que ele estava sentindo alguma dor (parou por várias vezes preocupada se o garoto estava bem). Chegado a hora de pagar, a moça foi se lavar no corguinho, o Alagoano saiu correndo com  o dinheiro e deixou a moça a ver navios. Não passado muito tempo a moça foi bater na porta de sua casa para cobrar o dinheiro de seu pai.
            Nessa época Carlinhos carregava os produtos comprados na feira em um carrinho que fedia peixe podre. Um de seus principais clientes era o dono do cinema, que liberava a entrada dele nas seções. Geralmente a segunda seção era filme para adultos, Carlinhos costumava a se esconder no banheiro, e o pessoal falava que havia criança escondida (mas havia um acordo nos serviços de frete da feira para liberação das entradas). Ao apagar das luzes Carlinhos e seus amigos arrumavam um canto para assistirem filmes adultos e chegavam a “lambuzar os bancos com os filmes”.
            Aos 17 anos ele e seus dois irmãos saíram para os canaviais para trabalhar. Havia um amiguinho “viadinho” que gostava de ir junto. Diz a história que Carlinhos era  o capataz e ficava organizando a zona. Formava-se uma fila de aproximadamente 15 pessoas na frente e 15 pessoas atrás do “viadinho”. A parte de trás era para comer e os da frente era para o menino chupar. Os irmãos participavam da orgia, já ele só “organizava a zona”.
            Carlinhos feio que só diz ter ficado com algumas primas e foi amasiado 4 vezes, uma delas com a mãe de seu filho. Diz ter encontrado neste ultimo relacionamento com Karla o verdadeiro amor, que o completa em diversos aspectos. Ela quem sustenta a casa temporariamente, cuida da casa e da comida. Fala que nunca irá separar (Vai saber se ele tem sorte de encontrar 2 anjos na terra).
            Em sua região não há frescura, todo mundo é igual a tatu, vive correndo atrás de um buraco. Conta a história de uma ex ter roubado sua cueca usada só para ficar sentindo seu cheiro. Ele e seus amigos apostavam quem pegava mais menina principalmente na festa de São José. Certa fez acordou todo sujo por ter rolado no ralo e rola com as meninas nos pastos bêbado.

            TRABALHO

            Desde os 12 anos o Alagoano já trabalhava, a principio tratando de animais da propriedade de seu padrasto. Foi carregador de produtos da feira, foi guia turístico onde as pessoas o procuravam para fretar ônibus e passar feriados nas praias. Sua principal profissão ainda hoje é soldador, mesmo que da sua amada Karla.
            Nas diversas situações vividas, Carlos conheceu um tal de técnico de segurança do trabalho que não faz “porra nenhuma” e fica criticando o serviço dos outros. Cismado com isso decidiu fazer o curso, estagia no frangos canção na área de segurança. E conta o tão diferente que é o aspecto de segurança do trabalho no nordeste para a região sul.

            AMORES

            O irmão, Jair, Brinco, Edineide, Lucrecia, Willians – todos nordestinos que lutam pela uma vida melhor moram em Sarandi e são parceiros inseparáveis. Essas pessoas foram padrinhos do casamento no Civil entre Carlos e Karla.
            Karla seu grande amor, diz que sem ela, ele não é nada. Para onde vai a mulher tem que estar do lado.
            Nasceu flamenguista, mas ao ver o Corinthians da época do jogador Viola jogar mudou de time e hoje bate em seu peito a paixão corinthiana.
            Ele acredita ter muita capacidade, e pra piada o cara é muito bom, diz que as pessoas podem conhecer e ler muito mais que ele em diversos aspectos, mas ele é o campeão em leitura de contos eróticos.
            Quer ser técnico de segurança para ver os outros trabalhar, e cuidar de sua segurança.

            CONCLUSÃO

            É uma história de luta, aventura, superação. A busca da pessoa por aprendizado o faz crescer em diferente níveis:

  • Social – Ciclo de amizades;
  • Relacionamento – Aprender a conviver com pessoas;
  • Profissional – Oportunidades melhores de serviço e remuneração;
  • Psicológico – Ter mais confiança.
Carlinhos apesar de ter passado por dificuldades não deixa de viver intensamente cada situação. E a alegria e malicia de encarar a vida são diferenciais para fazer merecedor dessa pequena homenagem.

domingo, 5 de dezembro de 2010

João (de peão a técnico de segurança)

Certa vez questionei sobre quais requisitos uma pessoa deve ter para conseguir conquistar seus desejos, a resposta veio assim: - A pessoa deve ter habilidade e ser competente. De certa forma essa resposta quer dizer muito, mas não era o que eu estava esperando ouvir.
Na hora me veio à lembrança de uma história e com ela a resposta que eu esperava ouvir. As pessoas na minha opinião deve ter mais que habilidade e ser competente para conseguir as coisa, primeiro ela deve ter amor pelo que faz e quando sonhar buscar com todas suas forças.
João é o senhor de quarenta e poucos anos, que durante toda sua vida foi “peão de obra”, se fizermos uma comparação sobre tudo aquilo que passou as oportunidades que ele teve de estudar, empregos.... é difícil acreditar na sensibilidade que ele teve de se chegar de certa forma a resposta. Hoje em dia o ambiente de obra é um luxo se comparada a tudo que o “seu João” deve ter passado.
Seu João faz um curso técnico de segurança do trabalho (se forma em 6 meses), ele não tem muita habilidade para estudar e em um mal entendido ele se sentiu menosprezado por um colega de sala onde disse que suas idéias não estavam sendo aproveitada pelo grupo.
Pela primeira vez aquele senhor calmo, sereno, tranquilo se descontrolou e ficou ofendido pela situação. Apesar de toda dificuldade e experiência de vida ao tentar acalmar ele passou uma lição de vida.
Ele disse assim: - Sabe Fábio, eu nunca tive muitas oportunidades e apesar da minha idade eu sempre quis melhorar de vida, ter um ensino superior. Mas a vida não me deu muitas chances eu sempre quis ter um diploma de algo e eu busco nesse curso de técnico de segurança alcançar. Hoje em dia uma faculdade é muita cara e eu tenho outras prioridades como pagar aluguel. Por isso que eu vim fazer um curso técnico, que mesmo que não seja igual a uma faculdade foi uma das formas de tentar melhorar de vida.
A garganta deu um nó e eu me lembrei da minha época de faculdade onde pensava que um diploma iria resolver a metade de meus problemas. Um dia desses ai atrás ter um diploma pra mim já foi um sonho (realizado) e assim os sonhos foram alterados. Ter habilidade e ser competente são fatores importantes, mas ninguém começa lá de cima a vida vai nos ensinando a todo instante. O que se deve ter para alcançar seus desejos é força de vontade, persistência e amor pelo aquilo que faz.
Tenho certeza que quando você quer melhorar de vida e faz por merecer a vida vai apresentar grandes portas de oportunidades e o “seu João” sonhador vai ser um grande e responsável técnico de segurança do trabalho com o tempo porque lutou com amor por aquilo.